Os hinos nacionais que conheço (português incluído) são estúpidos, por várias razões que me abstenho de enunciar.
O do México, por exemplo, diz que o país foi criação do dedo de Deus, uma criação misturada (como em tantos outros hinos) com violência (ou apelo à marcha contra canhões). Aconteceu que, um dia, estava Deus a ouvir o dito hino e conversou com os querubins e serafins que o rodeavam. Juan Miguel Zunzunegui registou a conversa em La tiranía de las ideas. Transcrevo um pedaço do relato:
Deus, que na verdade nunca foi muito sério, mas sim travesso e brincalhão, estava muito circunspecto. Ele ouvia o hino nacional mexicano e não estava nada contente com as calúnias que essa ode à violência fazia sobre a sua divina pessoa.
— Que diabos é isso de que o destino deles foi escrito pelo dedo de Deus? Eu não tenho nada a ver com isso, nem sequer tenho dedos. E já estaria na hora de pararem de me pedir para fazer tudo por vocês e, ainda por cima, me empurrarem o destino deles.
Isso aconteceu numa audiência em que dois anjos o interrogavam sobre o mau tratamento que ele dava a esse canto do planeta chamado México, que por mais que se esforçasse não conseguia sair da miséria, e que, em contrapartida, ele tinha sido tão generoso com aquele outro canto, um pouco mais ao norte, conhecido como Estados Unidos, onde aparentemente tudo dava certo.
— Pois... a mim, que me levem para o inferno se eu tiver algo que ver com todo esse assunto.
— Bem — respondeu um dos querubins —, ambos os povos afirmam que Tu inventaste os seus países.
— Sim — acrescentou o outro —, os mexicanos afirmam que escreves o seu destino, rezam muito para ti o tempo todo, dizem que gostas que sejam pobres e que por isso irão para o céu, e não param de dizer coisas como: «Se Deus quiser», «Que seja o que Deus quiser», ou consolam-se argumentando: «Já estava no destino». Estão convencidos de que tudo é culpa tua.
— Sim, claro — respondeu o Senhor (que, se é criador, certamente é Senhora, mas concordaremos em chamá-lo de Senhor para não confundir) —, eles também passam o tempo dizendo que Me imploram e batem com o malho, mas só imploram e nunca batem com o malho (*); ou que Eu ajudo quem madruga, quando quem madruga está se ajudando sozinho. Além disso, prestem atenção, nunca rezam para Mim, mas para onze mil versões diferentes de supostos santos e virgens.
(*) referência à expressão castellhana "A Dios rogando y con el mazo dando" [equivalente ao português "A Deus rogando e com o malho dando"], cujo significado está explicado aqui.
escrito por ai.valhamedeus
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